O corvo e a raposa

Certa vez, um velho corvo
Voava sem nenhum pejo
Para a árvore em que vivia
Com um pedaço de queijo,
Porque degustá-lo aos poucos 
Era seu maior desejo.

De repente, sob a árvore,
Passa a matreira raposa.
E esta, ao ver o velho corvo
Que em galho alto repousa,
Diz em tom bem lisonjeiro:
“Meu amigo, como ousa?”

“O que quer essa finória?”,
Pensa, inocente, o tal corvo.
Disse ela: “Desse ‘pecado’,
Amigo, eu não o absolvo.
A sua beleza é tanta
Que chega a ser um estorvo.

Suas penas e seu porte
São exemplos para nós.
Eu só queria saber,
Antes, durante e após,
Se, entre os seus dons, também
Inclui-se uma bela voz”.

“Claro que sim, minha filha!” –
Diz o corvo fanfarrão.
E, bancando o Pavarotti,
Abre o bico, sem noção,
E tarde demais percebe
Que o seu queijo foi ao chão.

A raposa abocanhou
O queijo, logrando a ave.
Depois disse: “Amigo corvo,
Vai um conselho suave:
Tem voz, porém não tem cérebro.
Eis um problema bem grave!”.


Marco Haurélio
Do livro: Trilhas de aprendizagens:
Ensino Fundamental - 4º ano - volume 2
São Paulo, Secretaria Municipal de
Educação (SP)/COPED, 2021